quinta-feira, 5 de junho de 2008

LIDANDO COM AS ARAPONGAS DA VIDA

“Então, por favor, me dêem isso: um pouco de silêncio bom para que eu escute o vento nas folhas, a chuva nas lajes, e tudo o que fala muito além das palavras de todos os textos e da música de todos os sentimentos”. Lya Luft

Não! Não pense que irei falar sobre as arapongas da política, que estão em voga no cenário nacional. Onde para aqueles que não conhecem, no meio político brasileiro a pecha de ser chamado de uma araponga, é justamente um sujeito que participa de alguma reunião ou negociação escusa, e grava e filma tudo, para usar isto posteriormente a seu favor, ou para terceiros, enfim para conseguir algum benefício ou chantagir as pessoas futuramente, para se dar bem...
Eu porém gostaria de falar da araponga verdadeira, ou seja: de carne e pena. Mas antes, permita lhe traçar um pequeno histórico de minha apreciação pelas aves, que veio desde cedo. Minha mãe disse, que desde quando era criança adorava ouvir os sons dos pássaros, e sempre ficava entusiasmado quando via algum, justamente pelos belíssimos cantos que emitiam. E com o passar dos anos, fui conhecendo diversos pássaros através de livros especializados, e hoje posso afirmar que conheço razoavelmente bem as aves. Mas uma em especial, a araponga tem me chamado à atenção, que muito ao contrário dos demais pássaros seu canto é disforme, irritante, e não possuí melodia alguma, permita-me traçar um perfil da mesma, conforme diz o dicionário aurélio – araponga:

Ave passeriforme, contingídea (Procnias nudicollis (Vieil.)), do Brasil médio-oriental e leste meridional. O macho é branco, sendo verde a zona nua da cabeça; a fêmea é verde-azeitona na parte superior, amarelada com manchas escuras do lado ventral, o vértice e a garganta preta. Alimentam-se exclusivamente de frutos, e o seu canto lembra os sons metálicos produzidos pelo bater de ferro em bigorna. 2. Fig. Pessoa de voz estridente, ou que fala aos gritos.


Acredito que nos deparamos com muitas arapongas em nossas vidas. Gente que fala aos gritos, berros, e pelos “cotovelos” também para intimidar, mostrar poder, coagir etc. Mas que no fundo nem se conhecem a si mesmos, e nem como seres humanos sociais, e pensam que fazendo assim, mantêm seu respeito. Gente que nunca quer dar o braço a torcer – mesmo que esteja errado. Gente egoísta, cheia de si mesma, eterno narcisista. E quando percebem suas falhas (pois todos têm, e quem acha que não possuí se engana redondamente), recorrem ao falar alto para intimidar, e ter sua vontade atendida e assim suplantar seus erros. E por incrível que pareça às pessoas que mais são assim, são as que gozam de certo status, ainda que seja pouco, que ao invés de agregar as pessoas para perto de si, muito pelo contrário acabam gerando sanha e espalhando todos que estão ao seu redor. Pobres pessoas...

Minha mãe muito sábia em várias histórias diuturnas que carregam valores morais embutidos em si mesmas, recordou-me, de uma que me contou quando criança, que transcrevo aqui, cujo titulo é Carroça Vazia:

“Certa manhã, um homem, muito sábio, convidou seu filho para dar um passeio no bosque e ele aceitou com prazer. Ele se deteve numa clareira e depois de um pequeno silêncio perguntou:
- Além do cantar dos pássaros, você esta ouvindo mais alguma coisa?
E o filho apurou os ouvidos alguns segundos e respondeu:
- Estou ouvindo um barulho de carroça.
- Isso mesmo, disse seu pai, é uma carroça vazia.
Perguntei ao meu pai:
- Como pode saber que a carroça esta vazia, se ainda não a vimos?
Ora respondeu meu pai:
- É muito fácil saber que uma carroça está vazia por causa do barulho. Quanto mais vazia a carroça estiver, maior é o barulho que faz”.

Tornei-me adulto, e até hoje, quando vejo uma pessoa falando demais, gritando (no sentido de intimidar), tratando o próximo com grossura inoportuna e descabida, prepotente, interrompendo a conversa de todo mundo, e querendo demonstrar que é a dona da razão e que detém a verdade absoluta, tenho a impressão de ouvir a voz de minha mãe quando me contou a história acima: “Quanto mais vazia a carroça, mais barulho ela faz...”

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